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Cavalo de Troia: a verdade sobre a PEC da Segurança Pública

**Por Luiz Fernando Ramos Aguiar via Gazeta do Povo

Temos observado uma verdadeira carga de cavalaria ideológica em favor da PEC da Segurança Pública, capitaneada pelo ex-ministro do STF e atual ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, que tem investido suas tropas para tentar derrubar todas as barreiras que se impõem contra a proposta. Mesmo com as forças progressistas desferindo golpes na mídia, os lobbies e os posicionamentos dos “especialistas” ideológicos, as fortificações do bom senso têm resistido heroicamente aos ataques. Mas a verdade é que a resistência se impõe muito mais por motivos políticos do que pelos efeitos potenciais da medida na segurança pública brasileira.

No entanto, como qualquer vitória em uma causa justa é boa, não podemos ignorar a insatisfação dos governadores em relação à PEC da Segurança Pública. Ameaçados em sua autoridade e temendo uma queda na autonomia decisória de suas cadeiras, os mandatários dos executivos estaduais têm feito pressão no governo federal no sentido de impedir a medida, excetuando-se, obviamente, aqueles que fazem parte da base do atual governo.

Nesse sentido, potencializar o apoio aos governadores rebeldes é fundamental para fortalecer as muralhas de contenção das forças progressistas. Contudo, no longo prazo, se não fundamentarmos políticas públicas na realidade e nas reais necessidades do país, estaremos fadados a sempre estar na defensiva, protegendo-nos de novas medidas como a PEC da Segurança Pública que, apesar de textualmente defenderem a segurança das pessoas, quando implementadas têm o resultado oposto.

Nesse estilo de guerra, temos perdido diversas batalhas. Temos visto excrecências como audiências de custódia, saídas temporárias, progressões precoces de penas e outras medidas lenientes se proliferarem em nossa legislação, mesmo que suas práticas demonstrem nocividade à sociedade e contribuam para o caos que vivenciamos na segurança pública. Cada uma dessas políticas simboliza uma derrota na busca pelo controle do crime e pela manutenção da tranquilidade pública.

Mostrar às pessoas a incapacidade da agenda progressista e seus interesses ideológicos no campo da segurança pública é a tarefa fundamental das pessoas realmente comprometidas com o tema

E essas batalhas foram perdidas não apenas no campo político, mas principalmente no campo das narrativas. As tropas progressistas, utilizando suas forças de choque, dominam o discurso público, convencem parlamentares e colocam os dissidentes na espiral do silêncio, fazendo com que suas teorias sejam as únicas possíveis de serem debatidas. Aqueles que discordam são imediatamente classificados como violentos, desumanos, inimigos das garantias fundamentais, antidemocráticos ou qualquer outro rótulo que retire a legitimidade do discordante nas discussões públicas

As poucas vitórias que obtivemos vieram após o advento das redes sociais, quando as vozes dissidentes encontraram canais para manifestar um pensamento diferente das narrativas canonizadas pelo mainstream. Um exemplo clássico foi a lei, de iniciativa do deputado Guilherme Derrite, que acabou com as saídas temporárias. Ainda assim, a medida perdeu grande parte de sua relevância quando o Judiciário entendeu que apenas os criminosos condenados após a promulgação da lei poderiam ser privados desse privilégio, de até 35 dias de férias da cadeia por ano.

A mais urgente das medidas em relação à segurança pública, que deveria ser alvo de uma PEC, não está na centralização das decisões relativas ao combate ao crime, o que só burocratizaria ainda mais as ações e abriria margem para licitações faraônicas, pela possibilidade da compra centralizada em Brasília de equipamentos e tecnologia. Na verdade, trata-se de dotar as corporações policiais de mais autonomia, agilidade e ferramentas para se contrapor às forças criminais, o que implica na adoção do Ciclo Completo de Polícia

O Brasil é o último país do mundo a cultivar a “jabuticaba” do ciclo incompleto, onde uma corporação, a Polícia Militar, realiza o policiamento ostensivo e preventivo, enquanto outra, a Polícia Judiciária (Polícia Civil, Polícia Federal), executa o policiamento repressivo ou investigativo. Essa realidade resulta em um modelo contraditório, no qual uma corporação inicia o atendimento e outra o conclui, gerando retrabalho, morosidade e intermináveis disputas institucionais, tornando o modelo policial brasileiro um dos mais ineficientes, burocráticos e lentos do planeta.

O quadro é potencializado pelas políticas garantistas que fomentam a impunidade e incentivam a reincidência, dando aos criminosos a certeza de que, no Brasil, o crime compensa. E não é por outro motivo que 10% de todos os homicídios ocorridos no planeta estejam localizados no Brasil.

Quando uma guarnição da Polícia Militar atende uma ocorrência, ela precisa se deslocar até uma delegacia, levando vítimas, testemunhas e autores do crime. Os procedimentos de registro de ocorrência são complexos e demorados. Se o caso envolver prisão em flagrante, a situação se torna ainda pior: não é raro que os policiais permaneçam no distrito policial por longas horas e, muitas vezes, sequer retornem para sua área de atuação no mesmo turno de serviço. Além disso, em muitos municípios não existem delegacias, o que obriga os policiais a percorrerem, em alguns casos, centenas de quilômetros apenas para realizar o simples registro de uma ocorrência.

Enquanto os representantes de classe defendem as prerrogativas de suas corporações e as forças progressistas concentram seus esforços emprojetos como a PEC da Segurança Pública, medidas revolucionárias, como a desmilitarização, a unificação das polícias ou a extinção de alguma força, os profissionais de segurança pública e a população continuam reféns de um sistema caótico e ineficiente.

A interrupção deste ciclo vicioso de lentidão, burocracia e revitimização precisa ocorrer imediatamente. Contudo, as disputas corporativas e o desinteresse dos políticos em enfrentar o verdadeiro gargalo da segurança pública tornam o Brasil um case de fracasso quando o assunto é a organização do sistema policial. Isso se torna um calcanhar de Aquiles no enfrentamento da criminalidade, especialmente quando se trata das facções que dominam milhares de comunidades no país.

Como a implementação do Ciclo Completo de Polícia não é uma medida revolucionária, ou seja, não é uma solução desestruturante, as milícias progressistas não conseguem enxergar nela uma oportunidade de remodelar a sociedade, o que confronta suas crenças mais fundamentais e dogmáticas. Para eles, é necessário destruir as estruturas vigentes para que, de suas cinzas, possa nascer um novo sistema policial, utópico. Por isso, suas soluções são sempre no sentido de destruir ou remodelar as corporações existentes, ignorando toda a cultura institucional, seja ela boa ou ruim. Como a atual PEC da segurança amplia a concentração do poder nas mãos de uma autoridade central, eles enxergam uma oportunidade de avançar em direção a suas reformas utópicas. Este é o principal motivo de apoiarem a medida: o famoso centralismo democrático.

Mostrar às pessoas a incapacidade da agenda progressista e seus interesses ideológicos no campo da segurança pública é a tarefa fundamental das pessoas realmente comprometidas com o tema. Expor as fragilidades do sistema é essencial para buscarmos soluções efetivas, sintonizadas com a realidade, mesmo que isso contrarie interesses corporativos. Sem isso, estaremos sempre na defensiva, à mercê dos ataques das forças progressistas, reagindo a suas investidas e, muitas vezes, perdendo batalhas importantes.

O foco daqueles que pretendem iniciar uma verdadeira mudança no caos da criminalidade brasileira deve passar invariavelmente pela mudança da organização do sistema policial, e o passo mais importante nessa direção é a imediata adoção do Ciclo Completo de Polícia.

**Luiz Fernando Ramos Aguiar é major da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), especialista em segurança pública e colunista da revista Blitz Digital.

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