Nas poucas horas em que a rede social X esteve disponível no Brasil na semana passada, centenas de publicações sugeriram um boicote ao Partido Social Democrático (PSD) nas eleições municipais. O motivo é claro: o partido tem a maior bancada no Senado, com 15 senadores em exercício, e apenas três deles se posicionaram favoravelmente à abertura de um processo de impeachment contra o ministro Alexandre de Moraes, responsável por impor censura ao X. O alvo principal de insatisfação dos usuários da rede é o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, senador do PSD por Minas Gerais, que teria o encargo constitucional de pautar o tema no Congresso e combater excessos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).
Em levantamento realizado pela Gazeta do Povo, sobre a opinião de senadores em relação à possível abertura de investigação das ações de Alexandre de Moraes, em um processo de impeachment, apenas Lucas Barreto (PSD-AP), Nelsinho Trad (PSD-MS) e, recentemente, Vanderlan Cardoso (PSD-GO) se posicionaram favoravelmente. Bene Camacho (PSD-MA) e Otto Alencar (PSD-BA) responderam ser contrários ao processo. Outros 10 senadores optaram por não se manifestar ou não atenderam à reportagem (veja a lista completa abaixo).
“O PSD também tem a maior bancada do Senado e é o partido do presidente da Casa. Qualquer movimento é um forte indicativo para a política nacional e tem muito peso, que pode, inclusive, levar outros partidos consigo”, avalia Felipe Rodrigues, cientista político especialista em Poder Legislativo. Por outro lado, Rodrigues destaca que uma característica marcante dos partidos do Centrão é justamente a ausência de posicionamentos partidários sobre temas polêmicos.
Postura pragmática do PSD é reflexo de Gilberto Kassab, fundador e presidente
Ricardo de João Braga, doutor em Ciência Política pela UERJ, afirma que o PSD é um partido essencialmente pragmático. Gilberto Kassab, fundador e presidente da sigla, declarou em uma entrevista que o PSD não seria “de direita, nem de esquerda, nem de centro”, quando ainda consolidava a criação do partido. “O Kassab é uma figura que tem muita estratégia política e a gente não pode esquecer que ele é a principal mente do PSD. O partido se aproveita das oportunidades que tem”, avalia Braga.
Uma das causas do perfil “camaleão” do PSD é a falta de coesão ideológica entre seus filiados, não exigida pela agremiação. A falta de coerência interna resulta em divergências pessoais entre os parlamentares e, consequentemente, em alianças políticas distintas em diferentes regiões do país.
O posicionamento de parlamentares do centrão não segue um projeto de país ou um conjunto de convicções, mas se dá de acordo com o contexto político local de cada senador, segundo os especialistas. “Questões de política local, como se o senador vai enfrentar uma nova eleição daqui a dois anos ou seis anos ou quem são os adversários no estado dele, mudam o grau de liberdade que ele terá”, comenta Braga.
Outro ponto destacado por Braga é que grande parte dos senadores responde a processos judiciais, muitos dos quais tramitam no STF. Retardar o andamento desses processos costuma ser uma estratégia para que os parlamentares possam garantir a sobrevivência da própria carreira política.
“O Supremo tem um estoque de processos de políticos e isso é uma cartada imensa que o STF tem na manga. Se você analisar cada um desses 15 senadores do PSD, é provável que a maioria deles esteja envolvido ou tenha aliados sob investigação”, conclui Braga.
Diretrizes partidárias contrastam com o silêncio dos senadores do PSD sobre censura
A primeira diretriz do PSD, anunciado no site oficial do partido, defende a liberdade de expressão e opinião. O texto também afirma que a sigla se opõe a qualquer forma de censura, controle, restrição ou regulamentação da mídia. Contudo, o partido e seus parlamentares não se manifestaram de forma contundente sobre os eventos recentes, como a suspensão do X pelo ministro Alexandre de Moraes.
Felipe Rodrigues observa que as diretrizes partidárias tendem a ser genéricas, mencionando apenas princípios básicos da democracia. Junto a isso, a tendência de um voto muito personalista não exige que os partidos se preocupem quanto aos princípios e valores que defendem. “Os casos em que posicionamentos ideológicos são mais evidentes são aqueles em que há grande comoção e apelo popular, o que ainda não se verificou nos episódios recentes”, comenta.
Os especialistas acreditam que o cenário atual dificilmente provocará uma mudança no posicionamento do PSD e de outros partidos de centro em relação às ações de censuras no Brasil. Apesar da crescente polarização do eleitorado brasileiro, os partidos que evitam se posicionar ideologicamente ainda conseguem manter sua relevância no cenário político.
“Muitos desses senadores pragmáticos de centro, durante os períodos de eleição, devem se ajustar às opções do sistema político para se tornarem mais aceitáveis. Assim, esse candidato de centro acaba negociando em seu estado qual tipo de representação ele adotará, se será mais de direita ou de esquerda”, explica Braga.
Gazeta do Povo