Por causa do congelamento no ano passado, contratos de saúde privada estão chegando para os usuários com reajustes que podem alcançar um acréscimo de até 70%. Entidades que congregam as operadoras justificam a reposição como uma forma de compensar custos
Após ter o aumento suspenso por quatro meses, por determinação da Agência Nacional de Saúde (ANS), em 2020, os clientes dos planos de saúde estão levando um susto com os pesados reajustes anuais atualizados nos boletos que começam a chegar. Alguns estão tendo aumentos de até 70%, uma conta que, se já estava pesada, tornou-se praticamente inviável de ser paga. Boletos têm chegado com acréscimos de até R$ 1,5 mil, para pânico de todos usuários, uma vez que a pandemia da covid-19 está longe do final e uma vaga esperança ter surgido com a tímida vacinação, que começou nesta semana.
A Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) enfatizou que os reajustes suspensos em 2020 se referem aos impactos de custos de 2019. “Portanto, trata-se de uma recomposição anterior ao período de pandemia”, salientou em nota. A entidade observou, ainda, que a cobrança diluída em 12 meses — entre janeiro e dezembro de 2021 — “visa dirimir os impactos e facilitar o planejamento dos contratantes de planos de saúde, sejam pessoa física ou jurídica”.
“Este é um período de muitos desafios. Exigiu contratações extraordinárias e aquisição de equipamentos em geral, de proteção individual, medicamentos, materiais hospitalares, entre outros, com um expressivo aumento de preços devido à inflação mundial repentina para esses itens”, justificou-se a Abramge.
Já a Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde) ressaltou que, “desde o início da pandemia, as operadoras associadas vêm empreendendo seus melhores esforços para permitir que os beneficiários mantenham seus planos, tendo, inclusive, suspendido, voluntariamente, os reajustes por 90 dias entre maio e julho”, salientou.
“Nosso interesse é, e continua sendo, que mais pessoas tenham assistência da saúde suplementar. Renegociações são realizadas todos os dias, a fim de que os preços das mensalidades possam se adequar à capacidade de pagamento dos contratantes”, frisou a FenaSaúde.
Sem saída
A manutenção dos preços dos contratos individuais e coletivos, em 2020, só foi possível depois que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), manifestou-se publicamente contra a autorização para o aumento –– classificou-a de “um desrespeito à sociedade”. A coordenadora do programa de Saúde do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Ana Carolina Navarrete, contesta os argumentos apresentados pelas operadoras de que os preços de 2021 simplesmente correspondem a uma correção não concretizada em 2020.
“Não pode ser uma questão de recuperação de prejuízo. O consumidor ficou vulnerável. Tudo que ele não pode é perder o plano. O cidadão perdeu emprego e renda, ao longo de 2020, e, com o isolamento, a demanda por exames e consultas despencou”, explicou. Ela calculou que o aumento médio ultrapassa os 35%. “Representa um alto risco de endividamento para a população”, reforçou.
No Procon do Distrito Federal, desde o início do ano, foram registradas 23 queixas contra os planos — algumas questionando o reajuste.
Ajustes no orçamento
O plano de saúde da terapeuta holística e taróloga Tatiana Cunha, 47 anos, subiu 28%, um total de R$ 700 a mais. Para bancar a mensalidade do contrato que cobre ela e o marido, precisará de ajustes no orçamento. “Em meio à pandemia, como nós dois somos do grupo de risco, não estamos usando nada do plano e, ainda assim, vem um aumento desse”, reclamou Tatiana.
Um servidor do Ministério Público Federal (MPF) que não quis se identificar disse ao Correio que seu plano teve um aumento de 70%, ou R$ 1,4 mil a mais, após uma avaliação da diretoria da operadora para corrigir a defasagem. “Tive que vender meu carro para ter fôlego financeiro. Foi um aumento absurdo. Continuo por uma questão de necessidade”, salientou o servidor, cujo plano cobre ele, a ex-mulher e o filho.
Auxílio-doença foi pago a quase 40 mil trabalhadores
Quase 40 mil trabalhadores formais precisaram se ausentar por mais de 15 dias do serviço por causa dos efeitos mais graves da covid-19, em 2020. De acordo com a Secretaria de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, 39.532 pessoas receberam o auxílio-doença entre abril e dezembro do ano passado.
Os meses de julho e agosto registraram o maior volume de trabalhadores que precisaram recorrer ao benefício do INSS após contraírem o novo coronavírus –– foram 8.415 e 7.131, respectivamente. No mês passado, houve 3.064 pedidos de auxílio-doença por causa da covid-19.
Os cerca de 40 mil trabalhadores que receberam o benefício no ano passado são apenas uma fração daqueles afetados pela doença, que causou 194.949 óbitos e infectou mais de 7,6 milhões de pessoas no Brasil, em 2020. Isso porque a conta mostra apenas os funcionários afastados do serviço por mais de 15 dias. Mas, por se tratar de um vírus de rápida propagação, a recomendação é o afastamento de todos os empregados, mesmo aqueles que tenham um quadro leve de sintomas, por pelo menos 14 dias.
O ministério ainda não tem os dados atualizados de todos os pedidos de auxílio-doença em 2020 (faltam os números de dezembro). Mas é possível verificar, também, uma redução nos pedidos relacionados a acidentes de trabalho, em decorrência do aumento do home office, na comparação com os mesmos meses de 2019.
Têm direito ao benefício aqueles com carteira assinada que estejam incapacitados de realizar o serviço habitual por mais de 15 dias consecutivos. O valor mensal do auxílio-doença é de 91% do chamado salário de benefício –– que seria o valor da aposentadoria do trabalhador, calculado pela média dos melhores salários com os quais ele contribuiu para a Previdência.
Como o auxílio-doença começa a ser pago pelo INSS a partir do 16º dia de afastamento, caberia às empresas bancarem o salário integral dos funcionários nas primeiras duas semanas de afastamento por covid-19. No entanto, a lei que criou o auxílio emergencial, em abril, autorizou as firmas a descontarem esses valores da contribuição previdenciária mensal, aliviando um pouco o custo para o setor produtivo.
Porém, com o fim do decreto de calamidade, em 31 de dezembro, as empresas voltam a ter de arcar com o custo integral dos trabalhadores afastados por covid-19 nos primeiros 15 dias.
8.415 benefícios foram concedidos em julho de 2020. Foi o pico do ano passado.
Fonte: CB