Médicos, fisioterapeutas e demais profissionais da saúde que atuam como pessoas jurídicas devem se preparar, pois, com a reforma tributária, podem ter um aumento expressivo na carga de impostos. Em alguns casos, a alíquota pode quase dobrar.
As mudanças afetarão quem opta pelo regime de lucro presumido e até mesmo quem está no Simples Nacional. A criação de um modelo chamado “Simples Híbrido” traz novas possibilidades – e possíveis armadilhas – que exigem análise cuidadosa e planejamento.
O aumento no volume de impostos, em relação ao que é pago atualmente, ocorrerá mesmo considerando a redução de 60% para profissionais do setor em relação à alíquota padrão do novo IVA.
Além disso, a questão do aproveitamento dos créditos pode demandar que os profissionais analisem seus clientes – se pessoas físicas ou jurídicas – e tomem suas decisões fiscais de forma estratégica.
Charles Gularte, vice-presidente executivo de serviços aos clientes da Contabilizei, alerta para pontos importantes a serem considerados pelos optantes pelo Simples Nacional e por uma novidade introduzida pela reforma: o Simples Híbrido.
Novo Simples Híbrido aumenta tributo, mas gera mais créditos
Os profissionais enquadrados no Simples continuarão com a mesma dinâmica atual, uma vez que foram preservadas as alíquotas atuais de ICMS/ISS e PIS/Cofins, afirma Cassiano Menke, advogado especialista em direito tributário do escritório Silveiro Advogados.
Durante a transição, o documento de arrecadação de todos esses tributos, o DAS, trará apenas a alteração na nomenclatura dos impostos atuais, substituindo os federais pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e os estaduais e municipais pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). A CBS e o IBS vão compor o IVA dual.
No entanto, as empresas da área da saúde enquadradas no Simples poderão optar por duas formas de contribuição:
- manter todos os impostos na guia do DAS, como é atualmente; ou
- escolher o modelo do Simples Híbrido, retirando o IVA do DAS e pagando-o à parte.
No primeiro caso, um CNPJ que preste serviço ou venda produtos para clínicas e hospitais permitirá que seus contratantes aproveitem somente os créditos referentes ao IVA recolhido no DAS, que é baixo. Considerando a primeira faixa do Anexo III do Simples Nacional, trata-se de cerca de 2,95% do valor da nota fiscal, explica Gularte.
No caso do Simples Híbrido, ao fazer o recolhimento do IVA por fora do DAS, o CNPJ pode gerar os créditos integrais para o seu contratante. Nesse caso, o IVA seguirá a alíquota geral para os profissionais de saúde que, com os 60% de desconto, chegaria a 11,2% do valor da nota fiscal, gerando montante proporcional de créditos.
É uma escolha que demanda análise e estratégia. Se, por um lado, o Simples Híbrido eleva a carga tributária para esse profissional, por outro, também aumenta os créditos que ele proporcionará para o contratante – o que pode torná-lo, do ponto de vista puramente fiscal, mais atraente.
Atualmente, para um CNPJ que se enquadre na primeira faixa do Anexo III do Simples, com faturamento de até R$ 180 mil por ano, a alíquota é de 6%. Como mostrado acima, no regime do Simples Híbrido, esse percentual sobe para 11,2% após a reforma, ou seja, um aumento de 5,2 pontos percentuais.
Permanecer no Simples pode ser uma armadilha do ponto de vista fiscal
Gularte avalia que, em razão dessa dinâmica, clínicas e hospitais podem, por exemplo, optar por contratar serviços e adquirir produtos somente de CNPJs que optem pelo Simples Híbrido. Elas também podem optar por empresas nos regimes de lucro presumido ou real, que propiciem custos correspondentes e maior oferta de créditos, gerando descontos mais elevados em suas alíquotas finais.
Do ponto de vista puramente fiscal, sem considerar a competência dos profissionais, aqueles que optarem por permanecer no regime atual do Simples Nacional, sem acréscimo na alíquota final do IVA, podem se tornar menos atraentes para os contratantes por gerarem menos créditos para essas empresas.
Guilherme Di Ferreira, diretor adjunto da Comissão de Direito Tributário da OAB/GO e responsável pela área Tributária no Lara Martins Advogados, avalia que a reforma tributária exige atenção e preparação dos médicos e demais profissionais da saúde.
“É fundamental consultar especialistas para avaliar o impacto das mudanças e adotar estratégias de transição. Além disso, o acompanhamento contínuo das regulamentações específicas será indispensável para garantir conformidade e minimizar os impactos financeiros.”
Reforma tributária praticamente dobra alíquotas do lucro presumido na saúde
Os profissionais e empresas de saúde que optam pelo regime de lucro presumido também sofrerão alta nas alíquotas, mesmo com o desconto de 60% no IVA garantido para o setor. Segundo cálculos da Contabilizei, nesse regime a substituição de PIS e Cofins pela CBS fará com que a tributação saia de 3,65% para 3,72%.
Em relação a ISS e ICMS, atualmente o setor recolhe entre 2% e 5%, a depender do estado e município. Neste caso, as estimativas para o IBS são de 7,48%.
Ou seja, no caso do lucro presumido o imposto final sairá de 5,65% (3,65% + 2%), no mínimo, ou 8,65% (3,65% + 5%) no máximo, para 11,20% – praticamente dobrando a alíquota no primeiro caso e elevando em 2,5 pontos percentuais no segundo.
Empresas de saúde no lucro real podem ter redução tributária
O regime de lucro real é o único que pode ter algum ganho, após a reforma tributária, em relação à alíquota final.
Atualmente, a tributação nesse regime é de 9,25% de PIS/Cofins e de 2% a 5% de ISS/ICMS, com a carga tributária resultante variando entre 11,25% e 14,25%. Como mostrado anteriormente, a alíquota final do IVA para o setor é de cerca de 11,2%, podendo representar redução na carga tributária.
Na visão de Gularte, a reforma tributária trará maior segurança jurídica e amplitude nos créditos tributários para os CNPJs da área da saúde optantes pelo lucro real. Eles também poderão descontar do IVA final as despesas com serviços e mercadorias, desde que não sejam destinadas para uso ou consumo.
Guilherme Di Ferreira defende que, mesmo nos casos em que as alíquotas sejam elevadas, as empresas podem encontrar estratégias de planejamento tributário a fim de otimizar a carga fiscal.
Além disso, como a reforma será implementada gradualmente, com um período de transição até 2033, haverá um período em que as regras atuais e as novas coexistirão, permitindo projeções e análises por parte dos afetados.
“Estratégias como reorganização societária e análise de despesas dedutíveis serão essenciais para minimizar a carga tributária durante a transição”, afirmou.
Por Roberta Ribeiro – Gazeta do Povo