A proposta de enquadrar o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) como organizações terroristas pode representar uma das mais profundas mudanças na política de segurança pública e jurídica do Brasil nas últimas décadas. Se levada adiante, a medida colocaria o país diante de uma nova fase no enfrentamento ao crime organizado — mais dura, mais abrangente e com efeitos que ultrapassam os muros dos presídios.
Hoje, o PCC e o CV não são meras facções criminosas; são estruturas complexas, com hierarquia, códigos próprios, financiamento multimilionário e influência direta dentro e fora dos presídios. Agem como verdadeiros cartéis, controlando rotas de drogas, armas e extorsões. Classificá-los como grupos terroristas não é apenas uma mudança semântica — é uma redefinição do tipo de ameaça que o Estado reconhece.
O enquadramento como terrorismo abriria brechas para o uso de instrumentos legais mais severos, como a ampliação da cooperação internacional, bloqueio imediato de bens, interceptações e ações integradas das Forças Armadas e das agências de inteligência. Além disso, facilitaria a extradição e o monitoramento financeiro em parceria com outros países, algo essencial diante da crescente transnacionalização dessas facções.
Por outro lado, essa decisão também traz desafios. O Brasil teria de evitar que a classificação fosse usada de forma política, ampliando o conceito de terrorismo para fins ideológicos — algo que poderia atingir movimentos sociais ou manifestações legítimas. Seria necessário estabelecer critérios objetivos e técnicos para evitar abusos e garantir que a medida se volte exclusivamente ao crime organizado armado e estruturado.
A rotulagem de “terrorismo” carrega peso político e simbólico. Passaria a reconhecer o PCC e o CV como inimigos do Estado, e não apenas criminosos comuns. Isso muda o patamar da resposta institucional: deixa de ser uma questão de segurança pública e passa a ser de segurança nacional.
O Brasil, historicamente leniente com a expansão do crime organizado, parece finalmente perceber que enfrenta uma estrutura de poder paralelo que desafia o Estado e aterroriza a sociedade. O enquadramento como terrorismo não resolve tudo, mas pode marcar o início de uma nova era — em que o medo, a impunidade e a omissão do poder público deixem de ser os principais aliados do crime.
Em um país em que facções ditam regras em presídios, bairros e até na política, reconhecer a natureza terrorista de suas ações é mais que uma medida legal. É um ato de coragem e, talvez, o primeiro passo para recuperar o monopólio da autoridade que o Estado vem perdendo há anos.
**Poliglota é jornalista e Editor-chefe do Portal Opinião Brasília





