As demissões de Daniela Lima e Eliane Cantanhêde não foram meros ajustes na grade. Nos bastidores da GloboNews, a leitura é outra: trata-se de uma mudança estratégica, cuidadosamente calculada, para remodelar o perfil editorial do canal e romper, ao menos na aparência, com a imagem de reduto progressista que a emissora consolidou nos últimos anos.
O timing não é acidental. A pouco mais de um ano da eleição presidencial de 2026, a direção da GloboNews sabe que não pode manter o rótulo de “inimiga da direita” sem perder audiência e relevância em setores importantes do eleitorado. O reposicionamento busca sinalizar neutralidade — ainda que parcial — para tentar reconquistar espectadores conservadores, desgastados com o tom agressivo contra o bolsonarismo entre 2019 e 2022.
Fontes internas revelam que a pressão não vem apenas da esfera política. Grandes anunciantes — alguns ligados a grupos empresariais simpáticos à direita liberal — teriam cobrado maior pluralidade de vozes. Em uma emissora que depende de assinaturas e publicidade, ignorar esses recados seria arriscado para as finanças.
Apesar da narrativa pública de distanciamento da esquerda, o fato é que a GloboNews sempre manteve contato estreito com lideranças conservadoras e até extremistas. Andreia Sadi conversou pessoalmente com Jair Bolsonaro pouco antes do ex-presidente ser alvo de prisão domiciliar e entrevistou Flávio Bolsonaro ao vivo recentemente. Natuza Nery chegou a contatar Carla Zambelli quando a deputada já era considerada foragida na Itália. E outros nomes do canal têm relações de bastidores com integrantes da tropa de choque bolsonarista, que servem como fontes privilegiadas para pautas exclusivas.
Ainda assim, o calcanhar de Aquiles da emissora é a falta de diversidade ideológica no time fixo de comentaristas. A maioria dos analistas é claramente progressista e, nos raros momentos em que vozes da “direita democrática” aparecem, o espaço é ocupado por nomes como Merval Pereira e Joel Pinheiro — que, não poucas vezes, se alinham a opiniões da esquerda em questões-chave. O resultado é um discurso que tenta se apresentar como equilibrado, mas que, na prática, deixa escapar um viés predominante.
Segundo apuração de profissionais que deixaram a casa, há resistência interna ao avanço de vozes mais à direita na programação. Parte da redação teme que abrir espaço para conservadores moderados possa, a médio prazo, servir como porta de entrada para figuras ligadas ao extremismo. Por outro lado, a cúpula executiva avalia que, sem esse “contraponto controlado”, a marca continuará sendo alvo fácil de acusações de parcialidade — munição perfeita para o discurso de políticos que buscam enfraquecer a imprensa tradicional.
No fim, a GloboNews caminha em um fio de navalha: se ceder demais à pressão por pluralidade, corre o risco de alienar sua base progressista fiel; se resistir, mantém viva a narrativa de que é apenas um braço midiático da esquerda. A pergunta que fica é se a mudança é apenas cosmética ou se veremos, nos próximos meses, um real reequilíbrio das vozes no canal — algo que, até agora, só existe no discurso oficial.
**Poliglota é jornalista e Editor-chefe do Portal Opinião Brasília