A esquerda brasileira inicia sua semana animada com a possibilidade da Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pela tentativa de golpe de Estado após a vitória petista em 2022
Realmente isso pode acontecer, principalmente após as investidas americanas e denúncias de um dos principais aliados e membro do governo Trump, Elon Musk, afirmar que houveram interferências do governo Biden nas eleições brasileiras. Essas denúncias podem fazer com que o Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, “acelere” a apresentação da ação.
Segundo algumas grandes mídias nacionais de informação, que tiveram privilégios de vazamento de informações sabe-se lá porque, isso deve acontecer antes do carnaval já que a peça está pronta.
Mas a coisa não será tão simples assim como o governo pensa e a esquerda sonha. A denúncia, caso apresentada, terá que passar por um longo processo jurídico onde os ritos deverão ser acompanhados com lupa por todo país. Além disso, não resta a menor dúvida de que durante todo o processo da ação penal o país entrará numa turbulência jamais vista, principalmente dentro do Congresso Nacional, onde situação e oposição irão se digladiar ferozmente, cada um defendendo seus interesses.
Segundo alguns especialistas na área jurídica, uma ação dessa deve levar mais de 12 meses o que, em tese, levaria o caso para o ano eleitoral que é 2026. Isso, no entendimento do governo, não seria nada bom.
O desgaste do governo Lula é evidente. O principal fator é a crescente popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva que vem despencando mês a mês. Aliado a isso, críticas à economia que está caminhando para um abismo sem fundo, a alta no preço dos alimentos, desvalorização do real frente ao dólar, além de outras medidas, como a taxação de compras internacionais e a acusação de tentativa de monitoramento das transações via Pix — prevista em norma da Receita, revogada após um forte movimento nas redes sociais.
O Supremo Tribunal Federal (STF) terá que correr muito para desvencilhar esta ação antes do ano eleitoral. A oposição, que tem suas defesas prontas, vai contra atacar com a tentativa de aprovação de um Projeto de Lei de Anistia Geral para os presos condenados nos episódios do 8 de janeiro de 2023. Este Projeto não atingiria, a princípio, Bolsonaro já que ele é um dos políticos que clamam por uma anistia a ser colocada em prática pelo Legislativo, mas que a Lei afirma não ser possível anistiar pessoas que ainda estão sendo julgadas, que não receberam condenações, sob risco de interferência no Judiciário e, até mesmo, acusações de tentativa de obstrução de Justiça.
A PGR afirma que militares, integrantes do governo na gestão Bolsonaro e extremistas tentaram colocar em prática um golpe para anular o resultado das eleições e derrubar o governo eleito no pleito de 2022. A Procuradoria diz que Bolsonaro “planejou, atuou e teve domínio de forma direta e efetiva” em uma estratégia golpista para mantê-lo no poder, mesmo após ter perdido a disputa no segundo turno das eleições.
Além dele, foram denunciados também o general Braga Netto, Augusto Heleno, que chefiou o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira e outras 36 pessoas. A oposição convoca protestos contra o governo Lula para o dia 16 de março.
No Congresso, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União -AP), são pressionados para pautar ações relacionadas à anistia. Mas a resistência ocorre em razão do choque com o Supremo.
Entenda o Trâmite
Guilherme Barcelos, doutor em direito constitucional, advogado eleitoralista e membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), destaca que o julgamento das denúncias apresentadas pela PGR precisam seguir ritos processuais rigorosos, em que qualquer falha ou atropelo pode resultar em pedidos de anulação do julgamento, além de suspeição dos magistrados. “Há ritos processuais a serem respeitados, sendo que o seu desrespeito poderá ou deverá acarretar nulidades. Como a ação é originária (começa no STF), há previsão, inclusive, regimental, de apresentação de uma defesa prévia”, aponta o especialistas.
Barcelos explica, com exemplo: “Digamos que a denúncia seja apresentada. Antes da fase do recebimento a defesa será notificada para se manifestar — lembrando que o sujeito só se torna réu se recebida a denúncia. Somente após, a Corte avaliará se receberá ou não. Recebida a denúncia, o réu será citado para apresentar resposta à acusação, apresentando os seus argumentos iniciais e postulando pela produção de provas que entender pertinentes — como oitiva de testemunhas. O juiz avaliará de novo se a ação reúne condições de prosseguir. Se não, haverá absolvição sumária. Se sim, o processo segue”, afirma.
Ele destaca que a defesa de Bolsonaro, assim como a dos demais réus, pode ser feita por meio de depoimentos, que serão anexados no processo. “Tratando-se de processo penal há duas defesas a serem observadas. A técnica, realizada pelos advogados do acusado, e a defesa pessoal, realizada pelo próprio acusado. E quando a defesa pessoal poderá ser realizada? Por meio do interrogatório do réu. É ali que o réu falará, caso deseje. O réu pode permanecer em silêncio. Responder a tudo o que lhe for perguntado, seja pela acusação, seja pela defesa e, em sede de complementação, pelo juiz instrutor. E o réu, inclusive, se assim desejasse, poderia responder apenas às perguntas da defesa. Agora, partindo-se da hipótese de que eventual denúncia seja recebida e que o processo se desenrole a partir daí, não esperem que o ex-presidente venha a falar perante a tribuna do STF. Não. Isso poderá se dar perante uma audiência de instrução apenas, presidida, a rigor, por um juiz instrutor vinculado ao gabinete do ministro relator, por meio do interrogatório, ato final da instrução”, completa Guilherme.
O julgamento está previsto para ocorrer na Primeira Turma do Supremo, de acordo com o regimento interno do STF. O colegiado é formado por cinco magistrados. Porém, caso o relator, Alexandre de Moraes, demonstre interesse, o tema pode ser levado ao plenário, onde os 11 ministros poderiam decidir.
Nos corredores da Suprema Corte corre que o julgamento deve ser encerrado ainda neste ano, evitando que o tema gere turbulência nas eleições de 2026. A Procuradoria desistiu de apresentar uma denúncia conjunta com outras investigações, como no caso das joias, e vai fatiar as acusações, a fim de dar celeridade para cada caso.
Como dizem alguns velhos ditados, “querer não é poder” e “muita água ainda tem que passar por baixo dessa ponte”.
Da redação com informações do CB