A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de restabelecer a maior parte do decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que aumentou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), mesmo após sua revogação pelo Congresso, desmoralizou o Legislativo. Parlamentares e analistas ouvidos pela reportagem criticaram a decisão e afirmaram que haveria uma ação conjunta do Executivo e do Judiciário, mas nenhuma reação concreta está em andamento no Congresso até o momento.
O 1º vice-presidente da Câmara, deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), presidiu a sessão plenária após a divulgação da decisão de Moraes no início da noite de quarta-feira e a classificou como uma “desmoralização para o Congresso Nacional”. Altineu disse estar “se sentindo muito mal como parlamentar” diante da derrubada de uma decisão contra a elevação do imposto que havia sido tomada por 383 deputados e ratificada por unanimidade no Senado.
O deputado Coronel Zucco (PL-RS), líder da oposição na Câmara, disse que a medida é autoritária, inconstitucional e representa uma afronta à soberania do Congresso Nacional. Zucco afirmou ainda que o STF, ao alegar a função de mediador de conflitos, acaba atuando em favor de um governo que, em suas palavras, “não consegue cortar gastos e segue penalizando quem produz e consome”.
Para o deputado, o país está “refém” de uma aliança entre o Executivo e o STF, que, juntos, estão enfraquecendo os mecanismos democráticos de freios e contrapesos, fundamentais para o equilíbrio entre os poderes.
O senador Oriovisto Guimarães (PSDB-PR) fez críticas à prática das decisões individuais no Supremo. “Um homem sozinho, ministro Alexandre de Moraes, em uma decisão monocrática, disse à nação brasileira: eu sozinho posso mais que 513 deputados, que 81 senadores e que a Presidência da República. Não é possível que a Câmara continue engavetando a PEC que pede o fim das decisões monocráticas”, cobrou.
A PEC 8/21, que trata do fim das decisões monocráticas, busca impedir que ministros do STF e de outros tribunais superiores tomem decisões individuais (monocráticas) com efeitos amplos, como a suspensão de leis ou criação de despesas públicas. Ela foi aprovada no Senado em novembro de 2023, depois passou pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em 2024, mas está parada à espera de que o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), crie uma comissão especial para analisá-la.
Outras propostas paradas são a PEC 28/2024, que pretende dar ao Congresso Nacional poder para suspender decisões do STF, e a instalação da CPI do Abuso de Autoridade, defendida em plenário por Zucco após a decisão de Moraes. Ele afirmou: “383 votos foram desrespeitados. Esta Casa foi achincalhada, foi desrespeitada. Precisamos dar uma resposta, com a abertura da CPI do Abuso de Autoridade, pelo impeachment do Ministro Alexandre de Moraes”, disse Zucco cobrando uma atitude de Motta.
O presidente da Câmara foi até o Senado na quarta-feira (17) logo após a decisão de Moraes ser divulgada e debateu o assunto com o presidente Davi Alcolumbre (União-AP). Nenhum dos dois se manifestou sobre o tema mesmo após terem sido questionados por parlamentares e jornalistas.
A reportagem apurou que Alcolumbre teria dito a pessoas próximas que já esperava a ação de Moraes. Um senador envolvido nas discussões, que pediu para não ter o nome revelado, disse que Alcolumbre e Motta tentaram construir uma solução de meio termo.
A hipótese debatida era manter uma alta parcial do IOF para gerar arrecadação de R$ 5 bilhões em troca do Executivo liberar mais emendas não impositivas ao Orçamento para os parlamentares. Mas o governo venceu ao apostar em não negociar porque receberia respaldo do STF.
O líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), defendeu a atuação do STF, alegando que o tribunal apenas arbitrou um conflito entre os Poderes. “Não se trata aqui de anular a decisão deste Congresso Nacional. O governo foi ao STF para perguntar se era constitucional a atitude do presidente. O ministro Alexandre de Moraes entendeu que é constitucional (…) Alguém precisa arbitrar e foi o Supremo quem se posicionou.”
Parlamentares ouvidos pela reportagem afirmaram não enxergar qualquer caminho para mobilização do Congresso contra o STF e o Executivo sem a adesão de Motta e Alcolumbre.
Gazeta do Povo