A Operação Caixa de Pandora revelou o maior esquema de corrupção do DF. Nove anos após denúncia, 20 réus não foram nem serão julgados
Uma das ações mais emblemáticas da Caixa de Pandora chegou ao fim sem qualquer punição ou absolvição dos envolvidos, 14 anos após a deflagração da operação que escancarou o maior esquema de corrupção da capital da República.
O processo movido pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) contra 20 réus por formação de quadrilha – incluindo o ex-governador José Roberto Arruda e o ex-vice-governador Paulo Octávio (PSD) – prescreveu.
Significa que a Justiça não julgou os réus da Pandora a tempo nem poderá julgá-los mais, no âmbito da acusação de formação de quadrilha, em razão da longa demora no andamento do processo judicial.
A denúncia do MPDFT foi apresentada em 2014, portanto, já passaram-se nove anos. E, conforme prevê a lei, não é mais possível condenar ou absolver os réus pelo crime de formação de quadrilha. Na noite da última sexta-feira (17/3), a 7ª Vara Criminal de Brasília declarou a prescrição da ação para todos os 20 réus.
“Dessa forma, decorridos mais de 8 anos desde o recebimento da denúncia, deve ser reconhecida a prescrição da pretensão punitiva estatal. Declaro extinta a punibilidade pelos fatos imputados na denúncia (art. 288, caput, do CP), em relação a todos os réus, em face da prescrição da pretensão punitiva estatal pela pena em abstrato”, escreveu o juiz Fernando Brandini Barbagalo.
Justiça declara prescrição … by Isadora Teixeira
Segundo a denúncia do MPDFT no caso da formação de quadrilha, os réus “se associaram, de forma estável, permanente e mediante divisão de tarefas, com objetivo de cometer crimes, notadamente contra a administração pública, lavagem de dinheiro, falsidade ideológica e corrupção de testemunhas”. Os crimes revelados pela Caixa de Pandora teriam ocorrido entre início de 2006 e abril de 2010.
A prisão preventiva do então governador, José Roberto Arruda, em 11 de fevereiro de 2010, e a posterior cassação do mandato dele “deram início ao desmantelamento da quadrilha”, de acordo com o MPDFT.
“A poderosa quadrilha integrada por tais indivíduos, vinculados pela união nos desígnios de cometer os mesmos crimes, implantou um sofisticado estratagema de corrupção, entranhando-se na estrutura administrativa e de governo com a finalidade de cometer crimes para financiar suas atividades ilícitas, conquistar e manter o poder político e enriquecer seus membros e aliados”, disse o MPDFT na denúncia apresentada há nove anos.
Segundo o MPDFT, o delator do esquema de corrupção, Durval Barbosa Rodrigues, aliou-se à quadrilha para solicitar propina a empresários que prestavam serviços na área de informática. Em um dos episódios mais conhecidos da Caixa de Pandora, um vídeo flagrou o momento em que Arruda recebeu das mãos de Durval dinheiro em espécie, que seria oriundo de propina.
O MPDFT apontou que o grupo continuou a buscar valores ilícitos para financiar a compra de apoio político e as despesas da campanha vitoriosa de Arruda a governador, em 2006.
Prescrição
Há um prazo previsto em lei para a possível aplicação da punição contra quem teria cometido determinado crime.
Caso o prazo não seja cumprido, ocorre a prescrição, que é o fim da possibilidade do Estado punir o criminoso. A prescrição pode ser declarada antes mesmo que os réus sejam julgados ou após o trânsito em julgado da sentença condenatória (quando não há mais possibilidade de recurso).
No caso da ação por formação de quadrilha da Caixa de Pandora, a prescrição ocorreu sem que os réus sequer tenham passado por julgamento.
Quando ainda não há condenação, a sentença é calculada de acordo com a pena máxima prevista para o crime. No caso do delito de formação de quadrilha, o réu pode pegar pena de até três anos de reclusão, se for condenado. Segundo o art. 109 do Código Penal, quando a pena máxima é de três anos, a prescrição ocorre em oito anos.
O próprio MPDFT reconheceu, nos autos, que a prescrição ocorreu. Portanto, não deve recorrer contra a sentença da 7ª Vara.
Saiba quem são os réus beneficiados pela prescrição
- José Roberto Arruda – ex-governador do Distrito Federal
- Paulo Octávio – ex-vice-governador do Distrito Federal
- Durval Barbosa Rodrigues – ex-secretário de Relações Institucionais do Distrito Federal, ex-delegado da Polícia Civil e delator da Caixa de Pandora
- José Geraldo Maciel – ex-secretário-chefe da Casa Civil do Distrito Federal
- Fábio Simão – ex-chefe de gabinete de Arruda
- Ricardo Pinheiro Penna – ex-secretário de Planejamento do Distrito Federal
- José Luiz da Silva Valente – ex-secretário de Educação do Distrito Federal
- Roberto Eduardo Ventura Giffoni – ex-corregedor-geral do Distrito Federal
- Omézio Ribeiro Pontes – ex-assessor de Arruda
- Adailton Barreto Rodrigues – ex-assessor da Secretaria de Educação do Distrito Federal
- Gibrail Nabih Gebrim – professor da Secretaria de Educação do Distrito Federal
- Rodrigo Diniz Arantes – ex-secretário particular de Arruda
- Luiz Cláudio Freire de Souza França – ex-diretor do Na Hora
- Luiz Paulo Costa Sampaio – ex-gerente da Companhia de Planejamento do Distrito Federal (Codeplan)
- Marcelo Toledo Watson – policial civil aposentado
- Marcelo Carvalho de Oliveira – ex-presidente do grupo Paulo Octávio
- José Eustáquio de Oliveira – ex-coordenador do escritório político de Arruda
- Márcio Edvandro Rocha Machado – ex-secretário de Obras do Distrito Federal
- Renato Araújo Malcotti – empresário
- Alessandro Queiroz – empresário
A prescrição no caso de Malcotti, Queiroz e José Eustáquio de Oliveira já havia sido declarada pela 7ª Vara, em 2018. Como os réus tinham, à época, mais de 70 anos, o prazo para prescrição cai para a metade. Por isso, foram beneficiados antes.
O que dizem
Em nota o MPDFT disse que “atuou com responsabilidade e cautela, tendo cumprido todos os prazos processuais estabelecidos”.
A coluna questionou o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) a respeito da demora para julgamento do caso. Em nota, a assessoria do órgão informou que “o juiz não quis se pronunciar, uma vez que o magistrado não comenta decisão judicial por vedação legal, de acordo com a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman)”.
Advogado de Arruda, Paulo Emílio Catta Preta disse à coluna que “a declaração da prescrição é a aplicação da lei”. “Com a passagem do tempo, para esse tipo de crime tem previsão de prazo prescricional, que foi atingido.”
O advogado de Paulo Octávio, Marcelo Turbay, afirmou que “a defesa sempre esteve muito segura do fracasso dessa acusação em especial, independentemente da prescrição, pois conseguimos comprovar ao longo do processo a inocência de PO e os graves erros cometidos pelo MPDFT”.
Com informações Metropoles.com