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As teses extravagantes da antropológa que quer “descloroquinar” a segurança pública

A antropóloga Jacqueline Muniz avisa: o governo Lula precisa agir para “descloroquinar” a segurança pública — expressão usada por ela para criticar soluções supostamente fáceis e ineficazes. Segundo Jacqueline, o presidente deve parar de “ter medinho de desagradar a direita” e encarar o tema com a ousadia e o viés ideológico que, em sua visão, a discussão exige.

Professora da Universidade Federal Fluminense (UFF), Muniz ficou conhecida do grande público na última semana, após ser procurada por dezenas de veículos de imprensa para comentar a megaoperação policial contra o Comando Vermelho no Rio de Janeiro. É dela a tese insólita de que um criminoso portando fuzil “pode ser facilmente rendido até por uma pedra na cabeça’”.

Mas a acadêmica que causou indignação, virou meme e alega receber ameaças não é uma novata nesse debate. Doutora em Ciência Política, mestre em Antropologia e associada ao Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ela acumula uma trajetória de mais de 25 anos na formulação de políticas progressistas para o setor.

Muniz inclusive já ocupou cargos de alto escalão, no governo do Rio de Janeiro (na administração de Anthony Garotinho) e no Ministério da Justiça (durante o primeiro mandato de Lula). E a própria PM — instituição que a professora frequentemente critica — já a contratou para ministrar palestras em cursos de formação.

Já no doutorado, em 1999, intitulado “Ser policial é, sobretudo, uma razão de ser: cultura e cotidiano da Polícia Militar do Rio de Janeiro”, ela apresenta a metáfora do profissional como um “zumbi de patrulhamento”.

Segundo Muniz, o agente da lei é um “morto-vivo”, que “recebe a carteira de polícia e o atestado de óbito pendente”. Essa visão foi interpretada pelos críticos como um desrespeito ao sacrifício dos profissionais da área, tratados como “mercadorias políticas” em vez de heróis cumpridores do dever.

Jacqueline foi orientada no doutorado por Luiz Eduardo Soares, antropólogo e ex-secretário nacional de Segurança Pública (também no governo Lula 1). Durante muitos anos, Soares foi uma espécie de “voz da esquerda” na mídia com relação ao tema, sempre defendendo a “humanização” do combate ao crime e condenando a repressão.

Desencarceramento

Jacqueline Muniz é categórica ao defender a redução da população carcerária brasileira e a despenalização de delitos não violentos. “Vai ter que desencarcerar”, diz a professora, para quem o país “prende muito e prende mal” — e em “prisões ruins, mal feitas”. Ainda segundo ela, o Brasil padece de “uma espécie de populismo penal que responde ao apetite autoritário de ordem, mas não resolve o problema de segurança”.

Violência seletiva

Muniz afirma que a própria sociedade “autoriza” a violência contra determinados grupos. “A inocência é branca, a culpa é negra e operação é vermelha”, diz o título de um artigo acadêmico de sua autoria que analisa ações policiais. “Matar tem mérito, morrer tem merecimento no Brasil. A gente inventa a categoria bizarra da ‘vítima inocente’, o que quer dizer que existe a vítima culpada que mereceu ser assassinada.”

Bolsonarismo

Para ela, o ex-presidente Jair Bolsonaro não tinha interesse genuíno na segurança pública, mas sim em “sabotar instituições” para criar uma massa de “seguidores armados e manipuláveis”. “Eles [os bolsonaristas] odeiam polícia, odeiam as Forças Armadas. Eles querem indivíduos armados avulsos, vulneráveis, com dedo nervoso. Para eles aparelharem melhor, para eles radicalizarem com maior facilidade.”

Muniz desqualifica o projeto de combate ao crime instituído com sucesso pelo presidente de El Salvador. Para a antropóloga, a queda nos índices de homicídios no país da América Central é ilusória — resultado de acordos com gangues, não da redução efetiva da criminalidade. Ela ainda afirma que o modelo de Bukele é baseado em práticas brasileiras violentas: “Ele veio várias vezes aqui, inclusive quando eu estava em governo, para aprender como é que faz um bom Carandiru”.

Tarcísio de Freitas

Jacqueline sugere que o governador de São Paulo, popular por implementar políticas de segurança mais rígidas, é manipulado pelas corporações policiais. “Ele se deixou encantar pelo conto do boto policial. E terminou prisioneiro em seu gabinete, refém de chantagens corporativistas.”

Drogas

Muniz defende que o combate às drogas deve ser abandonado em favor de políticas de saúde pública — pois a limitação do acesso aos tóxicos não altera o desejo de consumo dos indivíduos. “A descriminalização é um passo importante para reduzir a corrupção e a bravata de políticos oportunistas que aparelham a polícia.”

“Cloroquinas”

Durante a pandemia, Jacqueline Muniz insistiu em traçar um paralelo entre saúde e segurança pública. Para ela, o ex-presidente Jair Bolsonaro tratou a crise sanitária e o problema da violência da mesma forma: receitando “cloroquinas” (remédios sem eficácia científica). “Se eu não quero cloroquina na saúde pública, também não quero na segurança, porque custa vida e liberdade”, afirma.

Para a antropóloga, a crise da segurança não é real, mas sim um projeto político bem calculado. O medo, segundo ela, é “aparelhado” e “instrumentalizado” para garantir votos e fazer a população aceitar a perda de direitos. “O profeta do caos fica o tempo todo pregando que o mundo está pior, que precisamos cada vez mais de uma autoridade autoritária.”

Letalidade policial

De acordo com Muniz, policiais que matam bandidos estão na verdade prestando um “serviço ao crime organizado” — porque eliminam possíveis testemunhas. “A inteligência e a investigação foram desmoralizadas. Quando você mata aqueles que podem dizer na delegacia e diante do juiz o que rola no crime, você está fazendo queima de arquivo.”

Policiais na política

O fenômeno da presença de policiais na vida política é tratado pela antropóloga como uma porta de entrada para a corrupção. “O barato do Bolsonaro foi desinstitucionalizar as polícias para possibilitar que oportunistas de farda corporativistas aparelhassem a polícia para fins particulares.”

Religião e crime

A professora acusa setores religiosos — especialmente neopentecostais — de atuar como canais de lavagem de dinheiro do crime organizado. “As principais lavanderias são carreiras políticas e igrejas. Igrejas que não têm de pagar impostos no Brasil”, afirma.

Jacqueline adota uma postura que relativiza a proteção do nascituro. Para a antropóloga, o debate sobre o aborto não envolve a defesa da vida, mas sim uma questão de “saúde pública” e de libertação do que chama de “tutela patriarcal” do corpo feminino. “O corpo da mulher é [visto como] a casa da sociedade, esse corpo não nos pertence.”

Soluções

Para “descloroquinar” a segurança pública, Jacqueline Muniz propõe reformas de processo e, sobretudo, de linguagem — como a “repactuação dos mandatos de policiamento público estatal”, o “controle do uso potencial e concreto da força”, os “protocolos públicos e publicados” e a “quebra dos monopólios de policiamento”.

As soluções, segundo Muniz, passam por ajustes internos, não por grandes mudanças estruturais. São saídas, como ela define, “administrativas, procedimentais” — “nem seria preciso mudar a Constituição”, diz.

O foco, em sua visão, deve ser em reduzir a autonomia das corporações no uso da força e supervisionar mais as decisões tomadas pelos policiais nas ruas — fatores que, acredita, acabam alimentando abusos e perda de comando.

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