”Os brasileiros, assustados, já não sabem o que é fato e o que é factóide político, tanto nas redes sociais quanto no noticiário tradicional”
Por Alexandre Garcia
A abertura da temporada de vacinação marcou o auge da politização do que deveria ser um caso técnico de saúde pública e não uma disputa de poder, um terceiro turno da última eleição presidencial, uma campanha eleitoral antecipada, um digladiar ideológico. Por motivos políticos, tivemos a disputa entre o “fique em casa e volte quando tiver dificuldade de respirar, porque cloroquina dá arritmia” versus o “previna-se com ivermectina e vitamina D e trate ao primeiro sintoma com hidroxicloroquina, azitromicina e zinco”. Era a receita pró e contra Bolsonaro. Depois, o governador Doria entrou na campanha, levando a vacina como mote. Aí, a disputa política foi reforçada por “vacina chinesa de 50% pioneira versus vacina Oxford de 70% que ainda está na Índia”.
O racionalismo ficou de lado, diante das emoções fabricadas pelo amplo marketing do coronavírus, que matou 101 mil brasileiros menos que as demais doenças respiratórias, conforme site do Registro Civil. Os brasileiros, assustados, já não sabem o que é fato e o que é factóide político, tanto nas redes sociais quanto no noticiário tradicional. Quantas vidas e empregos teriam sido poupados não fosse esse componente de campanha dogmática que inocula os fatos.
São dois lados da mesma intolerância, esquecendo do público que precisa da verdade despida de tintas ideológicas. Agora, temos a vacina do Doria e a vacina do Bolsonaro. Um lado não comemora o início da vacina do outro, enquanto o adversário festeja a demora da vacina que virá da Índia. O marketing contagiou uma questão de saúde pública e criou expectativas que vão muito além da realidade. Vacinas não deveriam ter propaganda enganosa.
Usar vacinas experimentais, como é o caso, tem a mesma lógica de usar um tratamento preventivo e uma terapia precoce –– é o que temos para tentar, incluindo as vacinas precoces, como são todas. Esse barulho político pode ter contribuído para não se ouvir o riso dos corruptos nas compras de respiradores, hospitais de campanha, material de proteção, culminando com a falta de oxigênio no centro do pulmão do mundo.
Por Alexandre Garcia – CB