O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), finalmente decidiu abandonar qualquer tentativa de disfarçar sua crescente irritação com o governo Lula — se é que um dia tentou. Ao anunciar que o PL antifacção será votado na próxima semana, Alcolumbre praticamente enviou ao Planalto uma mensagem em caixa alta: “Se vocês querem articulação, procurem outra porta.”
A frase “Vamos votar o PL antifacção na semana que vem”, dita após a sessão do Congresso, tem menos a ver com calendário e mais com política — política dura, direta, sem anestesia. Alcolumbre não está apenas acelerando um projeto que o governo gostaria de segurar; ele está lembrando Lula de que quem pauta o Senado é ele, não a vontade do Executivo, nem seus apelos tardios por “mais tempo”.
A Câmara aprovou o texto de forma avassaladora — 370 votos favoráveis — mas o substitutivo de Guilherme Derrite (PP-SP) virou do avesso o projeto original do governo. E é esse Frankenstein legislativo que chegará ao Senado, enquanto Alcolumbre observa, de braços cruzados, o Planalto tentar juntar cacos que ele mesmo empurrou mesa abaixo.
O governo esperneia dizendo que o substitutivo enfraquece a Polícia Federal ao redistribuir recursos recuperados em operações. Pode até ser verdade — mas Alcolumbre, sempre muito sensível a dramas do Executivo, decidiu não se comover. A pressa dele em votar é menos legislativa e mais pedagógica: uma aula de “quem manda” que o governo Lula parece ter faltado desde o início da legislatura.
Analiticamente, o movimento de Alcolumbre revela três coisas:
- A insatisfação dele com o Planalto não é episódica — é acumulada, e agora virou método.
- A articulação política do governo está tão fragilizada que até aliados formais já não fazem questão de esconder o distanciamento.
- O Senado caminha para uma autonomia desconfortável ao Executivo, que vive reclamando da falta de “harmonia entre os Poderes”, enquanto Alcolumbre responde com ironia silenciosa e pautas inconvenientes.
O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) deve apresentar seu parecer na terça-feira (2), mas esse é, no máximo, um detalhe técnico num tabuleiro cada vez mais político. Com Alcolumbre à frente, o recado está dado: o Senado não será o pronto-socorro do governo Lula, nem o espaço para desfazer trapalhadas da Câmara. E, se o Planalto quiser alguma consideração, terá primeiro de recuperar algo que há muito perdeu: prestígio.
Enquanto isso, Alcolumbre segue impassível — quase divertido — observando o governo correr atrás do próprio rabo tentando reverter um texto que ele mesmo decidiu empurrar ladeira abaixo.
Da redação por Jorge Poliglota




