Enquanto o governo Lula (PT) patina no combate ao crime organizado e se recusa a classificar facções como grupos terroristas, governadores de direita se articulam para tomar as rédeas na segurança pública para a cruzada contra o narcotráfico e suas ramificações no país.
Nesta quinta-feira (30), uma comitiva de governadores formada por Romeu Zema (Novo-MG), Jorginho Mello (PL-SC), Ronaldo Caiado (União-GO) e Ratinho Junior (PSD-PR) vai ao Rio de Janeiro para se reunir com o governador fluminense, Cláudio Castro (PL-RJ), e discutir ações de enfrentamento ao crime e o endurecimento da legislação penal.
A megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha, que prendeu traficantes do Comando Vermelho e resultou em 121 mortes (entre os quais quatro policiais), escancarou a divisão entre o governo federal e os estados das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, detentores dos melhores indicadores de segurança pública nacional.
Castro entrou na mira da esquerda e foi criticado pela quantidade de mortes na operação, durante o confronto entre as forças de segurança e os criminosos, que utilizaram drones para o lançamento de granadas contra os policiais. Em reação, os governadores aliados saíram em defesa de Castro pela “coragem em combater o crime organizado” e criticaram a “ADPF das favelas”, decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que impediu a deflagração de operações nos morros cariocas durante cinco anos.
A comitiva tem três nomes de pré-candidatos a presidente da República em 2026: Zema, Caiado e Ratinho Junior. Além deles, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), é cotado para a corrida presidencial do próximo ano, quando a segurança pública será um dos principais temas em debate durante a campanha eleitoral. Tarcísio participou da videoconferência na quarta-feira com Castro, mas não estará no grupo que visita o Rio de Janeiro no final da tarde desta quinta-feira.
Comitiva defende legislação rigorosa e classificação de facções como grupos terroristas
O tema da segurança pública já unia os líderes estaduais que representam o espectro da centro-direita antes da operação Contenção, no Rio de Janeiro. Com exceção de Caiado, os governadores integram o Consórcio de Integração do Sul e Sudeste (Cosud) para debate dos temas regionais.
Neste ano, o grupo defendeu a autonomia dos estados perante o governo federal para a criação de legislações estaduais mais rigorosas em contraponto à PEC da Segurança Pública, que promete centralizar o poder na União. Após a megaoperação no Rio, o grupo de governadores promete reforçar a pressão ao Congresso pela aprovação da lei que transforma as facções, como Comando Vermelho e PCC (Primeiro Comando da Capital), em organizações terroristas.
“Não é possível que alguém discorde de que esses bandidos, que tomam as ruas, usam drones para lançar granadas, fazem barricadas e usam pessoas como escudo humano, não sejam terroristas”, afirmou Romeu Zema. O governador mineiro foi um dos responsáveis pela convocação da reunião dos governadores em apoio a Cláudio Castro, no dia seguinte à operação Contenção, e organizou junto com o catarinense Jorginho Mello a viagem da comitiva ao Rio de Janeiro.
Neste ano, Zema visitou El Salvador, país da América Central que ficou conhecido internacionalmente pela política de segurança pública “linha-dura” imposta pelo presidente Nayib Bukele. Zema lembrou que a Comissão de Segurança Pública da Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que equipara os crimes cometidos por facções e milícias ao terrorismo, no mês de setembro, mas que a proposta precisa avançar no Congresso e ser sancionada pelo presidente Lula para ter efeitos práticos.
“Espero que o governo federal acorde e se mobilize para reconhecer que facções são organizações terroristas”, cobrou. Zema declarou que os governadores carregam o “ônus da ineficiência” do governo federal e criticou a falta de apoio da gestão petista à operação de combate ao crime organizado nos morros do Alemão e da Penha, no Rio.
Além disso, o chefe do Executivo em Minas voltou a cobrar a reforma da legislação penal. “Precisamos de punições mais rígidas para os líderes das facções. Isso passa pela mudança de legislação e por uma atuação forte do governo federal. Precisamos dar um basta ou queremos viver em um narcoestado?”, questionou.
Ação no Rio é estratégica para segurança pública nos estados, afirmam governadores
Antes do embarque para o Rio de Janeiro, o governador de Santa Catarina, Jorginho Mello, afirmou que a comitiva pretende discutir as ações de segurança pública com o governador Cláudio Castro, pois o combate ao crime no Rio é considerado estratégico para conter a violência nos demais estados.
Segundo ele, a preocupação dos governadores é com a ampliação das atividades das facções cariocas, que atuam fora do estado. “Está vindo muita gente morar em Santa Catarina porque aqui a gente dá bom exemplo de trabalho, de receber bem. Mas as pessoas têm que dançar no mesmo ritmo que nós dançamos”, disse Mello à reportagem da Gazeta do Povo.
O governador descartou que o encontro com Castro tenha motivação política, a menos de um ano das eleições de 2026, quando o chefe do Executivo catarinense disputará a reeleição. “Não é união ideológica ou partidária, é uma união operacional da sociedade contra o crime organizado. É isso que vamos discutir no Rio, como unir nossas inteligências, nossas estratégias e nossas ações.”
Mello ainda elogiou o correligionário do PL pela “coragem” de autorizar a megaoperação contra o crime organizado na tentativa de retomada do território carioca. “Estamos indo ao Rio de Janeiro para sermos solidários com o governador Castro pela coragem de ter feito uma operação daquela grandeza. Infelizmente, vidas se ceifaram. Mas o que fazer? Quem está do lado do errado, do tráfico e da bandidagem, paciência. Nós temos que pensar na maioria das pessoas”, declarou.
O governador Ronaldo Caiado foi outra voz a reforçar a necessidade de combater o avanço do narcotráfico em conjunto com outros estados. “A ação do Comando Vermelho ultrapassa as fronteiras do Rio e impacta a segurança pública em todo o país. Esse é um problema nacional.”
Para Caiado, o governo Lula tem uma postura conivente com o crime organizado ao recusar propostas como a classificação das facções como organizações terroristas. “Vivemos um estado de guerra, com a dominação do narcotráfico sobre parte do território nacional e a conivência do governo federal”, disse.
Defensor da autonomia dos estados para endurecimento das leis penais, o governador paranaense Ratinho Junior não se posicionou sobre a operação no Rio de Janeiro.
Lula defende PEC da Segurança e combate ao crime no “coração financeiro”
Lula voltou a defender a PEC da Segurança para a integração das forças de segurança no combate ao crime organizado. “Com a aprovação da PEC da Segurança, que encaminhamos ao Congresso Nacional, vamos garantir que as diferentes forças policiais atuem de maneira conjunta no enfrentamento às facções criminosas”, disse o petista.
A nota presidencial foi divulgada na noite de quarta-feira (29) após o encontro entre o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, e o governador Cláudio Castro, que anunciaram a criação de um escritório emergencial de combate ao crime organizado para conter a crise.
Lula reforçou o discurso do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que declarou que o governo federal tem enfrentado o crime “no andar de cima”. O presidente petista lembrou da operação Carbono Oculto contra fraudes e lavagem de dinheiro no setor de combustíveis, esquema coordenado pelo PCC, principalmente no estado de São Paulo.
“Precisamos de um trabalho coordenado que atinja a espinha dorsal do tráfico sem colocar policiais, crianças e famílias inocentes em risco. […] Foi exatamente o que fizemos em agosto na maior operação contra o crime organizado da história do país, que chegou ao coração financeiro de uma grande quadrilha envolvida em venda de drogas, adulteração de combustível e lavagem de dinheiro”, declarou.
Gazeta do Povo





