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Esquema milionário de vazamento de informações e venda de sentenças pode gerar buscas no STJ

O inquérito que investiga o vazamento de informações privilegiadas e venda de sentenças em Tribunais Regionais e no Superior Tribunal de Justiça (STJ) está longe do fim, com novas fases da operação previstas para os próximos meses e com um potencial que pode ser devastador. Fontes ligadas às investigações afirmaram à Gazeta do Povo que estão sendo cogitadas buscas e apreensões dentro da estrutura da segunda principal corte do país, o STJ, com a evidência do envolvimento de servidores no esquema criminoso.

Por enquanto, não há magistrados entre os suspeitos, mas ao menos quatro gabinetes de ministros estão na mira das apurações conduzidas pela Polícia Federal (PF) por determinação do ministro Cristiano Zanin, relator do caso no Supremo Tribunal Federal (STF). No ano passado, durante uma das fases da operação, a PF afirmou em manifestação ao STF que seria precipitado descartar a possibilidade de envolvimento de juízes, desembargadores ou até ministros nos crimes investigados.

Essas investigações já resultaram em pelo menos nove fases da operação batizada de “Sisamnes” em um esquema que pode ter iniciado ainda em 2020, mas que começou a ser desvendado com a morte do advogado Roberto Zampieri, em 2023, em Cuiabá (MT). Foi a partir das investigações da execução do advogado e da perícia no celular dele que a polícia encontrou as primeiras evidências de crimes relacionados à compra de sentenças judiciais. Desde então, um emaranhado foi se revelando em diversos estados brasileiros. Há alvos presos ou investigados em pelo menos sete estados e no Distrito Federal.

E a operação – que investigava inicialmente um suposto esquema de venda de sentenças judiciais envolvendo empresários, advogados, lobistas, chefes de gabinete e magistrados – ampliou suas apurações. As primeiras fases revelaram indícios de corrupção, violação de sigilo funcional e exploração de prestígio, com pagamentos negociados em troca de decisões judiciais favoráveis e até assassinatos por encomenda.

Na fase mais recente da operação, no fim de junho, materiais apreendidos em posse de presos, entre eles o prefeito de Palmas (TO), Eduardo Siqueira Campos (Podemos), prometem dar amplitude ao inquérito. A apuração será mantida no STF, já que nomes de ministros do STJ eventualmente poderão surgir no transcorrer do processo. Se o inquérito fosse desmembrado à Justiça Federal dos estados, corria-se o risco de anulação das investigações se ministros fossem arrolados como suspeitos.

Somente em valores apreendidos em diferentes fases da operação já foram mais de R$ 50 milhões em espécie, carros de luxo, imóveis e ativos em um esquema com centenas de envolvidos.

STF quer saber quem de dentro do STJ teve acesso a processos vazados

Para intensificar as investigações, o ministro Cristiano Zanin encaminhou ao STJ um ofício com pedidos detalhados de informações sobre servidores da Corregedoria Nacional de Justiça. A solicitação atende a uma recomendação da Polícia Federal, dentro do inquérito que apura a possível concessão de acesso privilegiado a informações sigilosas por parte de alvos da investigação em andamento. Os indícios envolvem processos sob relatoria de ministros que passaram pela Corregedoria, embora nenhum magistrado do STJ seja, até o momento, formalmente investigado.

No documento enviado à presidência do STJ, Zanin requisitou a lista completa dos servidores que atuam ou atuaram em dois gabinetes específicos de 1º de janeiro de 2024 até a data atual. O ministro também pediu logs de acesso e histórico de movimentações nos sistemas processuais, incluindo ações como criação, edição, exclusão e publicação de documentos, além da identificação dos usuários responsáveis em cada operação.

Entre os dados solicitados estão nomes completos, e-mails institucionais e pessoais, telefones e matrículas dos envolvidos. Os dados serão cruzados para identificação de possíveis vazamentos. Para embasar sua decisão, Zanin avaliou que são indiscutíveis a qualidade e a produtividade do Poder Judiciário brasileiro, mas que seu prestígio “lamentavelmente pode vir a sofrer máculas em virtude do agir de uma ínfima minoria de seus membros e servidores”.

O ministro disse ainda que eventuais condutas ilegais precisam de uma rigorosa apuração e que a gravidade dos casos revela preocupação, exigindo pronta resposta do STF, “até porque envolvem menção – verdadeiras ou não, não é possível saber neste momento – a ministros do Superior Tribunal de Justiça”.

O nome da operação faz alusão a um juiz persa punido por aceitar suborno, retratando a gravidade das práticas apuradas. Investigados chegaram a ter, segundo o inquérito, acesso de minutas e trechos de decisões e despachos de magistrados que seguiam sob sigilo. As investigações também querem saber se houve mudança direta no resultado das sentenças.

Investigação iniciou em 2024 com mapeamento de envolvidos

O trabalho mais pesado de apuração teve início em 2024 quando se começou a mapear redes complexas de corrupção, lavagem de dinheiro, obstrução de Justiça, vazamento de informações sigilosas e até homicídios, relevados a partir do assassinato do advogado Roberto Zampieri. O celular dele foi o ponto de partida para a investigação indicando uma ligação estreita com desembargadores e magistrados para uma suposta compra de sentenças nas mais diversas áreas.

Em novembro de 2024, a PF realizou uma grande operação dando visibilidade nacional ao caso. Era apenas a primeira etapa de uma série de ações policiais. Na ocasião foram cumpridos 23 mandados de busca e prisão preventiva em endereços de advogados, lobistas, assessores e desembargadores do Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJ-MT). Chefes de gabinete do STJ, que apareceram desde o início nas investigações, também viraram alvos.

O primeiro desdobramento levou à prisão do lobista Andreson Gonçalves e ao afastamento de servidores suspeitos. A defesa de Gonçalves tem dito que se manifestará apenas no processo.

Em dezembro do ano passado, a investigação avançou para apurar operações imobiliárias usadas na lavagem de propina oriunda da venda de sentenças; imóveis foram sequestrados por ordem do STF. Em março de 2025, a PF concentrou esforços, mais uma vez, na apuração do vazamento de informações sigilosas do STJ, com prisões de assessores do Ministério Público (MP) e advogados no estado do Tocantins.

A quinta fase, deflagrada em maio deste ano, teve como alvo uma rede supostamente de lavagem de dinheiro. Foram cumpridos 11 mandados de busca e apreensão, com sequestro de cerca de R$ 20 milhões e arrecadação de evidências sobre transações fraudulentas, negócios entre empresas do Centro-Oeste do Brasil e advogados.

O ministro Cristiano Zanin, do STF, determinou medidas cautelares como afastamentos, bloqueio de bens e sequestro de passaportes e as investigações prosseguem em várias frentes, avançando em cada nova etapa do inquérito quando são apreendidas novas evidências.

A PF, no entanto, não comenta oficialmente investigações em curso, mas a reportagem da Gazeta do Povo apurou que há frentes de apuração com alvos até o momento em pelo menos oito estados brasileiros envolvendo quatro gabinetes do STJ. Todas as investigações foram unificadas em um único inquérito no STF e ele segue sob sigilo.

A “Operação Sisamnes” ainda não encontrou um desfecho definitivo e pode estar bem longe disso ocorrer. O próprio STF admite que novas fases podem atingir desembargadores de outros tribunais estaduais e núcleos vinculados ao STJ.

Gazeta do Povo

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