Além de ser quem mais tem a perder nessa história, presidente demorou para se distanciar dos responsáveis pelo escândalo do INSS, e sua versão dos fatos não reverbera
Após dias de silêncio, Lula enfim falou, neste sábado, 10, sobre o escândalo do INSS. Como era de se esperar, o presidente culpou o governo do antecessor pelos descontos não autorizados, como seus aliados têm feito nas últimas semanas, mas o fato é que o governo Lula já perdeu essa batalha.
Antes de tudo, Lula perdeu no discurso porque é quem tem mais a perder. Ele precisa dar uma satisfação ao eleitorado sobre esse assunto antes da eleição de 2026, na qual o governo se engajou totalmente, muito antes da hora.
O petista está no comando do governo, e a alegação de que foram seus subordinados que descobriram e estão enfrentando os responsáveis pelos desvios — e o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, fez questão de dizer isso desde a primeira entrevista coletiva sobre o assunto — não é o bastante para esconder o fato de que foi durante sua gestão que os descontos mais cresceram.
Além disso, o governo demorou para se descolar dos responsáveis diretos por fiscalizar o pagamento das pensões, com as saídas tardias — e a contragosto — de Alessandro Stefanutto da presidência do INSS e de Carlos Lupi do Ministério da Previdência Social; no caso deste último, não ajuda no discurso o fato de ter sido empossado no lugar o número dois de Lupi.
Sindicatos
Pesa contra o governo Lula também o histórico sindicalista. Apesar de as entidades investigadas por desviar dinheiro dos aposentados não serem exatamente sindicatos, elas carregam o mesmo espírito associativo — e uma delas ainda tem um irmão de Lula entre os dirigentes.
Por último, o governo petista lida com uma oposição com a qual ainda não conseguiu se acostumar, depois de gozar anos de relativa tranquilidade contra os adversários do PSDB.
Cada vídeo de deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG, foto) escancara a distância entre a reverberação popular dos aliados de Jair Bolsonaro e o alcance das mensagens dos lulistas, a quem resta apenas acusar sem provas a utilização de robôs na disseminação das postagens.
Alcance
O vídeo de Nikolas sobre o escândalo do INSS distorce alguns pontos do processo que levou à fraude dos aposentados, na tentativa de poupar Bolsonaro, e é essa a mensagem que mais circula — foi vista 136 milhões de vezes só no Instagram até este sábado.
Para comparação, o deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP) publicou um vídeo na mesma rede social para culpar Bolsonaro. Em quase 24 horas, não passou de um milhão de views — a essa altura, o de Nikolas já somava mais de 20 milhões de visualizações.
Ocorreu algo parecido no caso do monitoramento do Pix, quando um vídeo de Nikolas levou o governo a cancelar a instrução normativa da Receita Federal para ampliar a coleta de dados sobre as movimentações feitas por meio da ferramenta criada pelo Banco Central.
Governo fraco
Isso é também reflexo de um governo fraco, que, quase dois anos e meio após o início, parece não ter sequer começado. A principal preocupação do governo Lula, desde antes mesmo de começar, é ele mesmo.
A PEC da Transição, aprovada ainda no governo Bolsonaro, ampliou a autorização para gastos para além de um nível responsável, exatamente na tentativa de justificar um governo injustificável, de um condenado na Justiça que teve os processos anulados por subterfúgios judiciais.
A queda de popularidade de Lula ao longo do mandato veio para deixar essa situação mais clara para os próprios governistas, apesar de eles seguirem sustentando o discurso de que tudo não passa de um problema de comunicação.
Resta aos lulistas, agora, dobrar a aposta na irresponsabilidade, prometendo ainda mais benefícios em busca de alguma popularidade que justifique o retorno de Lula à presidência da República. Mas ainda há muitas batalhas para perder até a eleição de 2026.
O Antagonista