- PUBLICIDADE -

“PEC da Segurança é manobra de poder, não solução para o crime”, diz deputado Bilynskyj

O deputado federal Paulo Bilynskyj (PL-SP), presidente da Comissão de Segurança Pública, tem se colocado na linha de frente da oposição contra a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Segurança Pública apresentada pelo governo federal. Para ele, a proposta não visa combater o crime, mas sim ampliar o controle político da atual gestão sobre as polícias.

Em entrevista exclusiva à Gazeta do Povo, Bilynskyj foi enfático ao afirmar que a mudança nas atribuições da Polícia Federal (PF) e da Polícia Rodoviária Federal (PRF), prevista no texto, amplia o espaço para investigações seletivas. Ele opina que, com um efetivo limitado, a PF inevitavelmente fará uma seleção dos casos com base em critérios políticos. Ele foi delegado da Polícia Civil de São Paulo antes de ser deputado.

Ele também criticou a tentativa de intervenção federal nos protocolos das polícias estaduais e municipais. Segundo Bilynskyj, a ideia de padronizar procedimentos sob o comando da União esconde um projeto de centralização e controle, não de cooperação. O governo federal argumenta em defesa da PEC que haverá uma maior integração entre as polícias dos estados e nega intenção de reduzir a autonomia dos governadores.

Para Bilynskyj, o governo quer controlar até o tipo de armamento usado pelas Guardas Municipais, o que considera uma tentativa disfarçada de enfraquecer as forças locais em benefício de uma polícia federalizada e politizada.

O presidente da Comissão de Segurança Pública vê a proposta como uma resposta política em um momento de baixa popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e não acredita que a PEC seja uma solução real para os problemas da segurança pública no Brasil. Bilynskyj avalia que os debates sobre a PEC devem se prolongar até 2026, o que dificultará qualquer avanço significativo por parte do governo.

O parlamentar também é autor de uma proposta que proíbe o uso de armas de fogo por agentes de segurança da Presidência da República — medida que, segundo ele, tem o objetivo de evidenciar a incoerência do governo na política de desarmamento.

Confira a seguir a entrevista completa:

O senhor já expressou preocupação com a centralização das polícias pela União prevista na PEC da Segurança. Poderia detalhar como essa centralização pode afetar a eficácia das forças de segurança estaduais?

Paulo Bilynskyj: A gente começa pela questão de atribuições da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal. Entre os problemas da PEC está o fato de a proposta alterar a atribuição da Polícia Federal, permitindo que ela investigue todos os crimes praticados por organizações criminosas ou por milícias privadas. O problema é que é não há efetivo e a PF terá que escolher os crimes a investigar. Vai funcionar mais ou menos como funciona o Gaeco [Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado], que só investiga o que interessa para ele. Assim será com a Polícia Federal. Com um efetivo de 10 mil homens no Brasil, ela não vai dar conta de investigar todos os crimes praticados por organização criminosa. Ela não dá conta nem do que ela tem na mão hoje. O que vai acontecer é que a PF terá que escolher alguns [casos].

O verdadeiro elemento é que eles vão escolher casos em que eles podem, de alguma forma, atuar politicamente frente aos inimigos do sistema. Nós estamos vendo o caso do que está acontecendo em relação ao presidente da Câmara, Hugo Motta. Ele está perigando pautar [o projeto de lei sobre] a anistia. Com isso, estão chafurdando a vida da família dele na lama. O ponto não é dizer que a PF não pode trabalhar. Ela pode e deve investigar. Só que ela não pode, em momento algum, ter a possibilidade de fazer escolha do que que ela investiga ou não. Hoje, de acordo com a Constituição Federal, a Polícia Federal tem que investigar todos os crimes de competência da Justiça Federal. O que altera com essa mudança de atribuição é que agora ela vai poder investigar. E quem pode, não investiga. Quem pode, escolhe.

Os crimes de atribuição da Polícia Civil, por exemplo, a gente não pode escolher se investiga ou não. Há poucos dias, o secretário nacional de segurança pública, [Mario] Sarrubbo, disse que só 5% dos crimes são solucionados [pela Polícia de São Paulo]. Isso ocorre porque todos os crimes são registrados e não existe efetivo para seguir a termo com todas as investigações.

Em março de 2018, eu fiz um curso de proteção de dignatários na polícia de Miami. Na época eu estava trabalhando no departamento de homicídios. Naquele ano, nos três primeiros meses, eles tinham três homicídios para investigar. Eu tinha três homicídios por final de semana para investigar em São Paulo.

O que essa PEC está fazendo é criar o início de um monstro muito maior, que vai ser a Polícia Federal escolhendo o que ela quer, ou não, investigar.

Essa PEC também cria a possibilidade de a Polícia Rodoviária Federal ser utilizada para intervir na segurança pública dos estados.

Agora veja o problema. A primeira providência do governo Lula, em 2023, quando o ministro era Flávio Dino, foi impedir a Polícia Rodoviária Federal de fazer o trabalho fora das rodovias. Então, ele restringiu a atividade da Polícia Rodoviária Federal somente à previsão Constitucional. Nesta medida, Dino extinguiu os grupos operacionais, tirou a farda camuflada e os blindados da Polícia Rodoviária Federal. E colocou os policiais rodoviários para fazer fiscalização de rodovia, aplicando multas. O interesse do governo Lula não é em segurança pública. Se fosse, ele teria permitido que a Polícia Rodoviária Federal continuasse o seu trabalho de apreensão de drogas e de criminosos no Brasil, como desempenhou nos quatro anos de governo Bolsonaro. Não é esse o objetivo dele [Lula]. O objetivo dele é concentrar é o poder nas mãos da União. Então, agora a PRF vai virar uma espécie de milícia bolivariana do Lula, em que ele vai poder empregar essa polícia da forma como eles acharem mais interessante, no sentido de intervenção estadual.

Na prática, o que essa “milícia” pode representar para a população?

Paulo Bilynskyj: Ela vai poder intervir na segurança pública dos estados. Há quem possa pensar que é isso que a Força Nacional faz. Mas, na verdade, a Força Nacional serve para fazer troca de efetivo com o pagamento de diária. Então, você tira mil policiais do Rio Grande do Sul e coloca em Sergipe, e vice-versa. Assim, esses policiais recebem diárias por estarem trabalhando fora do estado e eles deixam uma “rachadinha” das diárias na mão dos comandantes. A Força Nacional não tem um impacto verdadeiro na segurança pública. O mesmo exemplo disso são os decretos de GLO [Garantia da Lei e da Ordem], com o emprego das Forças Armadas. Então, se você for analisar a apreensão de drogas feita com o estabelecimento das Forças do EB [Exército Brasileiro] no Rio de Janeiro, para reforçar a segurança pública, o volume foi ridículo. A apreensão nos aeroportos caiu. Esse tipo de coisa é só para fazer propaganda da GLO e do governo federal assumindo a responsabilidade pela segurança pública.

Em suas declarações, o ministro Ricardo Lewandowski tem afirmado que a PEC não retira a autonomia dos estados. Quais aspectos do texto atual representam riscos à autonomia estadual? 

Paulo Bilynskyj: Nesse ponto, especificamente, trata-se da competência legislativa da União. A PEC vai permitir que a União legisle sobre segurança pública de uma forma que nunca pôde desde 1988, ao alterar artigos da Constituição.

Levando em conta as sinalizações de Lula, desde a campanha até agora no mandato, o que, na prática, o governo pode fazer ao assumir competências que são legislativas? Quais são os riscos ao autorizar o governo a legislar?

Paulo Bilynskyj:  É difícil falar sobre isso, porque você está me pedindo para fazer um exercício de futurologia. Eu não consigo te falar exatamente porque, na verdade, o que se faz é abrir uma porta para que a União legisle de uma forma que nunca legislou. Eu não posso dizer um resultado prático, porque ele não existe imediatamente. Então, o ministro está falando uma meia verdade ao dizer que a PEC não vai alterar a autonomia dos estados. A PEC não altera mesmo. O que vai fazer é permitir que, a partir da PEC, a União legisle sobre segurança pública de uma forma que ela nunca legislou no passado. Então ela vai abrir a porta para que isso aconteça. Levando em conta que a gente [oposição] não tem maioria na Câmara e no Senado, o governo vai poder aprovar o que ele quiser em matéria de segurança pública, coisa que até hoje não consegue porque não tem permissão para legislar [neste tema].

A proposta do governo na PEC da Segurança prevê a padronização de protocolos e dados entre as forças policiais. Essa medida pode beneficiar a segurança pública?   

Paulo Bilynskyj: É infantil o ministro falar que as polícias cooperam mais internacionalmente do que nacionalmente. É mentira! O estado de São Paulo, por exemplo, tem uma base de dados de mais de 50 milhões RGs e não tem motivo nenhum para ceder para a União. Se for uma investigação, eles fazem a requisição e a gente faz a identificação, como sempre funcionou. Se um sujeito de Minas Gerais é preso em São José do Rio Preto, basta ligar para um delegado de polícia em Minas, que ele vai informar tudo o que precisar. Não existe problema nenhum de cooperação. O problema é que a União não tem acesso aos dados específicos dos estados.

Se essa cooperação já ocorre, qual é o problema alegado pelo governo? 

Paulo Bilynskyj: Não existe problema nenhum, não tem diagnóstico de problema nenhum. Eu quero que venha um secretário de segurança pública que fale que não consegue dados sobre identificação do indivíduo em São Paulo. É mentira. O que nós temos é o [ministro] Lewandowski dizendo que quer ver todas as 55 milhões de fichas de identificação civil de São Paulo e não pode. Ele está mentindo que existe um problema de integração. Ele não traz, para a exposição dessa PEC, problemas reais. Ele traz o desejo dele e transforma em problemas.

Só para ter um paralelo. Na Eslovênia, você não é obrigado a fornecer as suas impressões digitais para o governo. Lá, você só é obrigado a fornecer as impressões digitais do seu polegar da mão direita, caso você queira ter um passaporte. De outra forma, se você quiser ficar dentro da Eslovênia o resto da sua vida, você fica e não tem problema nenhum.

Então, o fato de ter um RG de São Paulo quer dizer que eu, Paulo Bilynskyj, cedi ao estado de São Paulo as minhas individuais datiloscópicas. Eu não cedi ao Lewandowski. Se ele quiser, ele vai lá e pede. Se ele estiver me investigando. Agora, de graça? É meio complicado.

O senhor vê que essa padronização de protocolos pode acabar impondo desafios a particularidades regionais? Mudar as regras de engajamento das polícias é uma das ambições desse governo?

Paulo Bilynskyj: Recentemente, o Lewandowski falou que ele acreditava que as Guardas Civis Metropolitanas (GCM) tinham que ser treinadas pela Polícia Federal, que é a polícia judiciária da União. A atribuição dela é investigar os crimes praticados contra a União e contra os seus agentes. Agora, qual é o papel da guarda civil metropolitana? É o patrulhamento preventivo ostensivo. Existe alguma relação entre polícia judiciária e patrulhamento preventivos? Não. São duas coisas diametralmente opostas. Então, quando o Lewandowski fala que a PF tem que treinar a GCM, é para poder controlar a GCM. Há quem diga que a Polícia Federal é muito boa no que faz e por isso poderia treinar a GCM. É a mesma coisa que falar que um mecânico, o Tião da esquina, deveria treinar um engenheiro da Toyota. Afinal de contas, o Tião mexe com carro. Em nenhum momento da sua história como instituição, a Polícia Federal fez patrulhamento ostensivo preventivo. Quando o Lewandowski fala em padronização, não é para que tenhamos um procedimento melhor. É para que ele possa mandar em qual é o procedimento que eles querem.

Isso pode interferir, por exemplo, no uso de helicóptero nas favelas, na maneira como são usadas ou sobre quais armas todas as polícias vão usar? 

Paulo Bilynskyj: Tudo isso! Ele [Lewandowski] falou inclusive que a Polícia Federal deveria dizer quais armas a GCM pode usar. O que a Polícia Federal sabe de armas para patrulhamento ostensivo preventivo? É simplesmente por controle, o objetivo não é fornecer um serviço de mais qualidade.

A esquerda diz que seria possível reduzir a criminalidade apenas com maior integração entre as polícias e investimento em ações de inteligência policial. O senhor é delegado, tem experiência prática. O que de fato funciona? 

Paulo Bilynskyj: Eu sou formado em Direito, com pós-graduação em criminologia, segurança pública e política criminal. Em primeiro lugar, é preciso definir o que é inteligência. Inteligência é coletar informações para um tomador de decisão. Não existe inteligência policial. Existe investigação policial, que é quando se busca a autoria e materialidade. É quando se busca descobrir quem cometeu o crime e como o crime foi cometido. Quando eles [esquerda] falam em inteligência, estão jogando uma palavra coringa, que todo mundo bate palma. É um discurso atécnico. Desde o começo da nossa conversa, a gente está é tentando destrinchar o que significam as palavras que foram utilizadas na apresentação dessa PEC.

Eu fui o primeiro a falar na reunião de líderes, quando Lewandowski entregou a PEC da Segurança. Ali eu perguntei por que não estava escrito que o nome da guarda civil metropolitana é polícia municipal. A resposta dele foi que a intenção era não causar confusão no público. Então quer dizer que a população confunde o que que é Polícia Militar com Polícia Civil?

Na lista de questões apontadas pela oposição como prioritárias temos a segurança armada em escolas, a questão das visitas íntimas a presidiários, endurecimento de penas para criminosos, redução da idade de maioridade penal e isolamento de líderes de facções em prisões de segurança máxima.  

Paulo Bilynskyj: Tudo isso poderia ser feito por PEC, mas nada é abordado pelo ministro ou pelo governo Lula.

Vocês, enquanto oposição, pretendem tratar desses pontos nessa PEC da Segurança? 

Paulo Bilynskyj: Eu acho que ainda está um pouco cedo para a gente discutir o que vai colocar lá dentro. Isso ainda vai depender muito da configuração dos membros da comissão especial, o que vai ser um problema. Além disso, o primeiro passo é na CCJ [Comissão de Constituição e Justiça da Câmara]. Vai ser uma luta. O pessoal vai querer fazer audiência pública. Eu mesmo devo apresentar vários requerimentos. Eu acredito que deva levar pelo menos seis meses para ela sair da CCJ. Depois vai ser criada a comissão especial, que vai fazer todo esse retrabalho. E só então a gente começa a pensar em alteração do texto. Mas eu te digo, com certeza absoluta, que o texto, da forma como ele está, a gente não vai permitir.

O senhor atuou na tentativa de mediação do decreto de armas publicado pelo governo no final do ano passado. Há espaço para diálogo entre o Congresso e o governo federal para ajustar a PEC de forma que atenda às preocupações dos estados e das forças de segurança? 

Paulo Bilynskyj: Eu acho que o governo não vai ter fôlego para dialogar. Porque o diálogo significa necessariamente que o governo vai ter que negociar. O governo está muito fraco para negociar e não tem o que abrir mão. O próprio PT foi contrário a essa PEC, porque ele viu que não vai ganhar nada. Eles sabem que não vai dar tempo de mexer na segurança pública nesse governo.

Até essas últimas investidas, governos petistas ainda não tinham enfrentado o tema da segurança pública com propostas como essa. O que o senhor acha que mudou? 

Paulo Bilynskyj: Primeiro: essa PEC não é um esforço para a segurança pública. Isso que tem que ficar claro. Essa PEC versa sobre as atribuições da Polícia Federal ou da Polícia Rodoviária Federal, de amarrar a GCM e de permitir que a União legisle sobre matéria de segurança pública, que ela nunca pôde. E nada disso melhora a segurança pública no país. Ela é uma jogada de poder. Ela tem uma influência muito forte do Supremo Tribunal Federal. Textual mesmo, isso o próprio ministro falou. Do meu ponto de vista, o governo vai desinvestir nessa PEC. O que você vai ver é que ela vai ficar na geladeira. Ninguém vai mexer nisso.

A aprovação, na Comissão de Segurança Pública, de uma proposta de sua autoria, que proíbe o uso de armas de fogo pelos agentes integrantes da segurança pessoal do Presidente da República, ganhou destaque nos últimos dias. Na sua justificativa, o senhor menciona a visão do atual governo sobre armas. Mas como fica a lei quando o governo acabar, levando em conta que a visão do próximo possa ser oposta? 

Paulo Bilynskyj: O objetivo dessa proposta nunca foi avançar. O cara que leva essa proposta a sério tem um problema cognitivo. Ele já não entendeu e saiu perdendo. O objetivo desse projeto é gerar debate, é gerar conscientização, é fazer o esquerdista defender arma e expor o governo Lula como hipócrita. O objetivo sempre foi expor a hipocrisia. Ele [Lula] desarma o cidadão de bem, mas não aceita ser desarmado.

Então, para a população, Lula quer menos armas, mas para ele, quer mais armas. O Supremo Tribunal Federal gasta cada vez mais com armamento, com segurança, mas ele julga e vota contra o armamento do cidadão. O mínimo que você exige de um ser humano é coerência. Se eu for sentar para conversar com você, eu quero que você tenha, porque se eu tenho arma de fogo e você não tem, você está em desvantagem. Tudo que o governo Lula fez em relação à arma de fogo na mão do cidadão de bem foi proibir. Mas a hora que eu digo que ele vai ser desarmado, aí não pode?

Gazeta do Povo – Por Aline Rechmann

- PUBLICIDADE -
- PUBLICIDADE -

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

- PUBLICIDADE -